As agências reguladoras exercem papel fundamental na estrutura do Estado contemporâneo, atuando na normatização, fiscalização e regulação de setores essenciais da economia. Dotadas de autonomia técnica e administrativa, essas entidades têm capacidade decisória própria. No entanto, essa autonomia não as exime da responsabilidade pelos danos que possam causar¹.
No ordenamento jurídico brasileiro, a responsabilidade civil do Estado — e, por extensão, das agências reguladoras — é de natureza objetiva. Isso significa que não se exige a demonstração de dolo ou culpa, bastando a comprovação do dano e do nexo causal com a conduta administrativa². Essa lógica é sustentada pela teoria do risco administrativo, que atribui ao Estado o dever de reparar danos gerados por suas atividades, mesmo lícitas³.
No caso das agências reguladoras, a responsabilidade civil decorre de sua atuação técnica e normativa. Quando decisões dessas entidades geram prejuízos indevidos, surge o dever de indenizar. Tal compreensão já é consolidada pela doutrina e encontra eco na jurisprudência, que reconhece a legitimidade das ações de reparação diretamente contra as autarquias especiais4.
É essencial, contudo, delimitar com precisão os casos em que haverá responsabilização. O mero descontentamento com a decisão não é suficiente. É necessário que haja efetivo prejuízo, ilegalidade, ou desvio de finalidade. Daí a importância dos princípios da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade no processo decisório dessas entidades5.
A responsabilidade das agências reguladoras também impõe desafios no plano da gestão pública. A adoção de mecanismos de controle interno, capacitação técnica de servidores e transparência decisória contribuem para mitigar riscos e evitar responsabilizações futuras6. Os princípios da transparência e da participação pública, nesse sentido, funcionam como garantias preventivas7.
Por fim, a judicialização das decisões regulatórias deve observar o equilíbrio entre a autonomia técnica das agências e o controle jurisdicional necessário para a proteção dos direitos dos administrados. A atuação do Poder Judiciário, nesses casos, deve se limitar à análise de legalidade e razoabilidade, sem substituir o juízo técnico-administrativo próprio da agência8.
Referências
- 1. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
- 2. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 37, §6º.
- 3. RIVERO, Jean. Droit administratif. Paris: Dalloz, 1990.
- 4. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2013.
- 5. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001.
- 6. NEVES, José Roberto de Castro. Responsabilidade por omissão das agências reguladoras. Migalhas, 2023.
- 7. VALDÉS, Daisy de Asper. Responsabilidade civil do Estado e as Agências Reguladoras. Revista de Informação Legislativa, 2003.
- 8. BARROSO, Luís Roberto. Agências Reguladoras. In: BINENBOJM, Gustavo (coord.). Agências Reguladoras e Democracia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.
